quarta-feira, 25 de março de 2015

PARÁBOLA DOS COFRES CHEIOS E HERBERTO HELDER

 
Um dia destes Maria Luís abriu a boca e, pronto, desculpem lá qualquer coisinha, saiu-lhe a frase ensandecida "Temos os Cofres Cheios!", logo aproveitada pelo chefe Passos Coelho, decerto, também, acompanhada pelo sorriso cadavérico do Sr. Silva de Belém.
"Temos os cofres cheios"!
Isto cheira a insulto.
Insulto a quem tem bolsos vazios.
Insulto a todos os pobres, que já ultrapassam  o número apurado em 1974!
Insulto a quem vê casas e ordenados penhorados.
Insulto a quem é forçado a emigrar.
Insulto a quem não sabre o que comer logo à noite.
Ou a quem não pode pagar água, luz, gás.
Como outro famoso insulto das mesmas bandas, Maria Luís deve ter pensado que Portugal está melhor mas os portugueses pior.
Como se Portugal dispensasse os portugueses.
O que, no fundo, é a matriz ideológica desta gente.
Cofres cheios, mas sim de dívida, embora o escondam, o dissimulem, o mintam, como é seu timbre predatório.
E a oposição dorme bem, muito obrigado, até um dia.
Mas para quê perder mais tempo com esta gente?

Herberto Hélder deixou-nos, e esse é maior, muito maior que essa canalha minúscula e lamacenta.
E também não tinha dinheiro para o gás...

"a última bilha de gás durou dois meses e três dias


a última bilha de gás durou dois meses e três dias,
com o gás dos últimos dias podia ter-me suicidado,
mas eis que se foram os três dias e estou aqui
e só tenho a dizer que não sei como arranjar dinheiro para outra bilha,
se vendessem o gás a retalho comprava apenas o gás da morte,
e mesmo assim tinha de comprá-lo fiado,
não sei o que vai ser da minha vida,
tão cara, Deus meu, que está a morte,
porque já me não fiam nada onde comprava tudo,
mesmo coisas rápidas,
se eu fosse judeu e se com um pouco de jeito isto por aqui acabasse nazi,
já seria mais fácil,
como diria o outro: a minha vida longa por muito pouco,
uma bilha de gás,
a minha vida quotidiana e a eternidade que já ouvi dizer que a habita e move,
não me queixo de nada no mundo senão do preço das bilhas de gás,
ou então de já mas não venderem fiado
e a pagar um dia a conta toda por junto:
corpo e alma e bilhas de gás na eternidade
- e dizem-me que há tanto gás por esse mundo fora,
países inteiros cheios de gás por baixo!"

( De "A Morte Sem Mestre")

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