sexta-feira, 21 de junho de 2013

"E PUR SI MUOVE"

No dia 22 de Junho de 1633 Galileo Galilei, já envelhecido e doente, abjurou, perante o tribunal do Santo Ofício, as suas convicções científicas, designadamente a teoria que defendia que a Terra e os restantes planetas giravam à volta do Sol, e que a Terra não era o centro do Universo, como defendia a tese de Aristóteles e Ptolomeu, e era consagrado pela Igreja Católica.
Acusado de heresia, o velho Galileo renegou, então, tudo o que dissera e escrevera.
A lenda diz que, no final do julgamento, terá pronunciado, em surdina, para que o Santo Ofício (actual Congregação para a Doutrina da Fé) não o ouvisse, a frase em epígrafe, que se pode traduzir como "E no entanto, ela move-se", aludindo à Terra.
A questão de o Sol ou a Terra serem o centro do Universo era muito mais que uma simples questão astronómica ou de Fé. Veja-se, ou leia-se, a excelente peça de Bertolt Brecht "Galileo Galilei".
O sistema aristotélico-ptolomaico era doutrina assente por mais de 1000 anos. Alterar esse conceito poderia conduzir, por exemplo, a questionar o direito "divino" dos reis, o direito "natural" a explorar servos da gleba, a propriedade "natural" de possuir escravos, a possibilidade "natural" de armar exércitos particulares, a inspiração "divina" de enviar Cruzadas contra os "infiéis", a existência "natural" de ricos e pobres.
No fundo, era colocar em causa todo um sistema de apropriação de bens, fossem eles fundiários ou fiduciários, meios de produção, e força de trabalho, para enriquecimento de muitos poucos.
Se a teoria vingasse, o que poderia suceder se a base da pirâmide começasse a questionar as bases em que a sociedade assentava?
Por isso, e como exemplo, Galileo foi condenado.
Só que ela, a sociedade, ao longo da História foi-se, de facto, movendo.
E continua mover-se.
Não falamos só deste país, com 23,5% da população considerada em situação de pobreza, com o PIB a representar 75% da média europeia (em 2010 era 80,3%...), em que o senhor de Belém diz que a acção do Estado deve ser substituída pela caridadezinha, em que o puto Maduro afirma que a chatice é "tudo ser contestado". É muito mais fácil ao poder despedir pessoas, cortar apoios sociais e alterar a lei da greve. Para a Terra continuar a ser o centro do Universo.
E mentir descaradamente e, pasme-se, sem contestação visível. Exemplo? Eis: O Sr. Coelho, e o puto Maduro têm o desplante de afirmar que o governo está a adiantar o subsídio de férias. Essa a afirmação. O facto é que os duodécimos que os funcionários do estado e empresas públicas têm vindo a receber respeitam ao subsídio de Natal. O de férias é atirado para Novembro (para skiarmos?). Não tapem a floresta com a árvore. Pela sua natureza, pela sua importância económica, pela sua própria designação, subsídio de férias e de Natal são realidades claramente distintas. Não nos anestesiem ou nos tomem por parvos!
Depois admirem-se de 15 de Setembro, greves de professores, ou greves gerais.
Mais do que a estafada dicotomia entre direita e esquerda, são a dignidade, respeito e auto-estima que se devem debater, e lutar por tal.
Tal como na Turquia, em que o movimento popular, de início assumindo uma vertente ecológico, subiu a outro mar, em o que se contesta é a pretensão de minar as bases em que a assenta a sociedade turca, orgulhosamente laica desde a revolução de Kemal Ataturk em 1923, através de uma subtil islamização. Desde a proibição de demonstrar afectos em pública, à proibição de ingestão de bebidas alcoólicas após as 22 horas. Acima de tudo, contesta-se a limitação dos direitos de uma sociedade liberal e as fundações laicas da República.
Tal como no Brasil, em que mais do que protestar contra o aumento dos transportes, se luta pela melhoria da qualidade destes, por mais e melhores hospitais e escolas, pela continuação do erradicar da pobreza, por uma mais racional distribuição das verbas públicas, comparado com os gastos astronómicos com o Mundial de futebol e os Jogos Olímpicos. 
Em qualquer dos casos, luta-se por uma melhor qualidade de vida, pela dignificação de cada um e de todos nós, pelo direito à felicidade, para que o Sol continue a brilhar e as flores a sorrirem-nos.
Para não dizer que não falei das flores...



   
    

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