quinta-feira, 23 de abril de 2015

ABRIL EM ABRIL - III - A PAZ, O PÃO, A SAÚDE...

Explicação do País de Abril
País de Abril é o sítio do poema.
Não fica nos terraços da saudade
não fica nas longas terras. Fica exactamente aqui
tão perto que parece longe.

Tem pinheiros e mar tem rios
tem muita gente e muita solidão
dias de festa que são dias tristes às avessas
é rua e sonho é dolorosa intimidade.

Não procurem nos livros que não vem nos livros
País de Abril fica no ventre das manhãs
fica na mágoa de o sabermos tão presente
que nos torna doentes sua ausência.

País de Abril é muito mais que pura geografia
é muito mais que estradas pontes monumentos
viaja-se por dentro e tem caminhos veias
- os carris infinitos dos comboios da vida.

País de Abril é uma saudade de vindima
é terra e sonho e melodia de ser terra e sonho
território de fruta no pomar das veias
onde operários erguem as cidades do poema.

Não procurem na História que não vem na História.
País de Abril fica no sol interior das uvas
fica à distância de um só gesto os ventos dizem
que basta apenas estender a mão.

País de Abril tem gente que não sabe ler
os avisos secretos do poema.
Por isso é que o poema aprende a voz dos ventos
para falar aos homens do País de Abril.

Mais aprende que o mundo é do tamanho
que os homens queiram que o mundo tenha:
o tamanho que os ventos dão aos homens
quando sopram à noite no País de Abril. 
(Manuel Alegre) 
Para quem não saiba, para os tais que suspiram pelo bafio e o opróbrio, para os amnésicos de última hora, para os distraídos em geral, recorda-se que, a 25 de Abril de 1974, Portugal travava uma guerra colonial em três frentes, injusta, fora do tempo, condenado a uma derrota humilhante e trágica, delapidadora da riqueza material e da riqueza humana.
Cerca de 8.900 mortos, 100.000 feridos e doentes, 14.000 deficientes, 140.000 pessoas sofrendo de perturbações do foro neurológico e psicológico. E uma juventude que, ou fugia à guerra (mais de 100.000) ou via o seu futuro sem esperança ao ser mobilizada para essa carnificina.
O 25 de Abril libertou a sua geração e as futuras desse pesadelo. A Paz foi uma realidade.
E se em 1973 tínhamos 40.303 alunos matriculados nos ensinos básico e secundário, 40 anos depois já contávamos mais de 440.000 e mais de 396.000 no ensino superior.*
Em 1973, o número de alunos matriculados nas Universidades era menos de 1% da população. Em 2011 já são 3,76%. *
Em 1973, o número de médicos e outro pessoal de saúde era de 94 por 100.000 habitantes. Em 2011 atingem-se 405.*
A esperança de vida média (mulheres e homens) era, antes do 25 de Abril, de 67,6 anos. Em 2011 já chega aos 79,8.*
A taxa de mortalidade infantil atingia, em 1973, uns negros 44,8% mas, 40 anos depois, cifrava-se em 3,1%! *
Por fim, o Produto Interno Bruto, per capita era, em 1973, de 7.979 euros e, em 2011, de 16.686 euros. *
Estes números provam, se tal fosse ainda necessário, que nada deste progresso, nada na melhoria das condições de vida da população, no acesso a triviais bens de consumo e de bem-estar, na erradicação da pobreza, da doença, do analfabetismo, na dignificação do Saber, da Cultura, da Ciência, da Inovação poderia alguma vez ter lugar se não tivesse acontecido o 25 de Abril e tudo o que, em termos institucionais, do Serviço Nacional de Saúde ao programa Ciência Viva, do Salário Mínimo Nacional ao Rendimento Social de Inserção, decorreu das alterações políticas e sociais verificadas.
Por isso, quando, neste mês de Abril, se anuncia que foi em Portugal que a taxa de risco de pobreza mais subiu, para uns trágicos 27,5%, é altura de dizer a este Governo e a este Presidente, e a quem, em nome de uma ideologia ultra-liberal e asfixiante da "verdade" única ,  querem destruir tudo o que, nestes 40 anos, tanto custou a construir, e voltar a reduzir o povo português a uma "apagada e vil tristeza", a uma pobreza envergonhada, a uma sujeição ajoelhada a uma certa ideia de Europa, onde o chamado socialismo democrático desistiu de lutar pelos seus ideais, que a paciência tem limites.
E que a alternativa, que terá de existir, sempre, não se pode resumir a uma simples operação de cosmética, mantendo o essencial desta política.
Tal como em 25 de Abril, a ruptura é urgente.
É que sem pão, saúde, habitação, educação, não há Liberdade que resista....    

(Sérgio Godinho - "Liberdade)

* - Dados do portal Pordata

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