sexta-feira, 31 de outubro de 2014

PELO SADO E ALENTEJO

 
(Ponte da EN253, em Alcácer do Sal, sobre o Sado)

Terras do Sado, terras de Alcácer do Sal, cidade das mais antigas da Europa, fundada por fenícios cerca de 1.000 A.C., aquela que foi a capital da província de Al-Kassr, dos tempos da permanência árabe, em que os crentes de Alá e de Deus conviviam à beira do rio, à beira das águas então límpidas e à beira das gaivotas, e o tempo andava na cadência certa dos dias e das noites.

(O castelo de Alcácer, debruçado sobre a cidade e o Sado)

Terra do grande matemático Pedro Nunes, e onde, tal como há séculos, ainda se continua a deambular preguiçosamente pelas margens do Sado, junto ao qual, num banco de jardim, se topa um residente de respeito:

(Gato em Alcácer. Será que é um parente afastado dos "Gatos" de Fialho de Almeida, primos do Alentejo ali ao lado, e que encimam o túmulo do escritor em Cuba?)

E de Alcácer ao Torrão vai-se num pulo, bem, num pulo talvez não seja, que a estrada é tipicamente do interior desolado, do interior ignorado, como o alentejano Torrão, que melhores olhos o viram, com quase metade da população de há 40 anos, ali abandonado, protegido pela torre da Matriz.

(Igreja Matriz do Torrão)

Terra do contista, poeta e dramaturgo popular Manuel Vicente Rodrigues, da escritora Maria Rosa Colaço, ou do amigo Sr. José Pimpão que, em S.Pedro de Sintra, ainda trabalha a arte alentejana do ferro.
E é também a vila que viu nascer Bernardim Ribeiro, que colaborou no "Cancioneiro Geral", de Garcia de Resende, e que nos deixou, entre outras obras, a novela "Menina e Moça", que começa assim:

"Menina e moça me levaram de casa de minha mãe para muito longe. Que causa fosse então a daquela minha levada, era ainda pequena, não a soube. Agora não lhe ponho outra, senão que parece que já então havia de ser o que depois foi. Vivi ali tanto tempo quanto foi necessário para não poder viver em outra parte. Muito contente fui em aquela terra, mas, coitada de mim, que em breve espaço se mudou tudo aquilo que em longo tempo se buscou e para longo tempo se buscava. Grande desaventura foi a que me fez ser triste ou, per aventura, a que me fez ser leda. Depois que eu vi tantas cousas trocadas por outras, e o prazer feito mágoa maior, a tanta tristeza cheguei que mais me pesava do bem que tive, que do mal que tinha."

(Bernardim Ribeiro, descansando no largo principal do Torrão)

E, falando de menina, e de moça, e nestes campos do Alentejo, abala-se do Torrão com uma moda tradicional, que o Vitorino Salomé, ele também alentejano dos quatro costados, do Redondo, popularizou e que nos deixa o perfume dessa vasta, bela e sofrida terra que nos desafia para além do Tejo.

 
(Vitorino, "Menina Estás à Janela")

 


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