segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

THE BEATLES, 50 ANOS DEPOIS...

Morreu o cantor e guitarrista britânico Tony Sheridan aos 72 anos

A notícia, por si só, talvez diga pouco a muito boa gente. Convirá, no entanto, referir que Tony Sheridan tocou com os Beatles aquando dos primeiros passos deste grupo, durante a sua estadia em Hamburgo. Por fazer parte do trajecto do melhor grupo rock de sempre (opinião pessoal), Sheridan já merece o seu lugar de honra no panteão da Música.

Sobre os Beatles, lembra-se a música "Norwegian Wood", elogiada por Leonard Bernstein, e junta-se um texto referente à carreira e à influência cultural dos Fab Four.


"THE BEATLES : 50 ANOS
E o “Yellow Submarine” continua a sulcar as águas da imaginação!
PRÉ-HISTÓRIA
5 de Outubro de 1962. Em Londres é lançado um single com as canções “Love me do” (lado A) e “P.S. I Love You” (lado B), de um grupo de rapazes de Liverpool conhecido como The Beatles.
E o mundo nunca mais foi o mesmo!
Naqueles tempos, mais exactamente em Março de 1957, John Lennon e alguns dos seus colegas da Quarry Bank School, em Liverpool, criaram um grupo inicialmente chamado The Black Jacks, mas que logo ficou conhecido por The Quarrymen, e cujos sons se baseavam no designado skiffle, então muito em voga, e onde se misturavam violas com cabos de vassoura e caixas de chá, banjos com tábuas de lavar roupa e garrafas, com nítidas raízes no jazz, blues e country. Paul Mc Cartney juntar-se-lhes-ia meses mais tarde (Julho de 1957), apresentado a John por um amigo comum aquando de um espectáculo dos The Quarrymen, na igreja de St. Peter, Liverpool .
Em Fevereiro de 1958, com quinze anos, e após insistência de Paul, George Harrison junta-se ao grupo. Em Janeiro de 1960, um velho amigo de John, Stuart Sutcliffe, a pedido daquele torna-se mais um elemento da banda, tocando viola baixo. Apenas o baterista, na altura, era rotativo.
Tendo em conta as diversas origens dos seus actuais elementos, já não fazia sentido que o grupo tivesse um nome ligado a uma escola. Assim, depois de várias designações (Johnny and the Moondogs, Long John and the Beatles, The Beetles – literalmente, Os Besouros-), a banda fixou-se definitivamente, e passou a ser conhecida por The Beatles.  
A primeira digressão do grupo é curta. Apenas ao Norte da Escócia (Maio de 1960), e com um cantor solista (!), de seu nome Johnny Gentle.
Em seguida, foram contratados para actuações em Hamburgo. Uma vez que não tinham baterista, convidaram para tal Pete Best, filho da proprietária do The Casbah Coffee Club em Derby, Liverpool, onde tocava com a sua banda, The Blackjacks, e no qual os Beatles, por vezes, actuavam.
A 16 de Agosto de 1960, o grupo partiu para Hamburgo. Ali tocavam sete dias por semana, seis ou sete horas por noite. O reportório consistia preponderantemente em rock and roll americano dos anos 50, devendo referir-se que um dos músicos inspiradores da banda, segundo os próprios, sempre foi Elvis Presley. No entanto, as coisas em Hamburgo não correram conforme esperado. George é deportado a 21/11/1960, por ter mentido sobre a sua idade (tinha então 17 anos!) e, após um incêndio acidental, Paul e Pete são presos e deportados. John, triste, e sem um chavo, regressa a Liverpool  em meados de Dezembro. Apenas Stuart fica em Hamburgo, na companhia da sua namorada  Astrid Kirchherr a qual, refira-se a título de curiosidade, resolveu mudar o corte de cabelo de Stuart, no que seria, de imediato, imitado por John, Paul e George, transformando o penteado numa marca impressiva da banda. Nascia a moda dos cabelos compridos (compridos??).
Em Abril de 1961, voltam a Hamburgo, actuando no “Top Ten Club” e, também, tocando como banda de apoio do cantor Tony Sheridan o qual realizou uma série de gravações para a Polydor Records alemã, que, assim, foram as primeiras dos Beatles. Diga-se que Sheridan ganhou um disco de ouro com vendas acima de um milhão de cópias do seu disco Tony Sheridan and The Beatles. Quando estes regressam a Liverpool, Stuart fica definitivamente na Alemanha, junto de Astrid, dedicando-se à sua verdadeira paixão, a pintura, e Paul passa a ser o viola baixo.
Stuart morreria em 10 de Abril de 1962, aos 21 anos, vítima de hemorragia cerebral.
Consta que, mais tarde, John se referirá a ele como o 5º. Beatle, se bem que esta designaçâo abranja diversas pessoas, desde Brian Epstein a George Best.    
De regresso à sua cidade natal os Beatles, a 21 de Fevereiro de 1961, apresentam-se pela primeira vez no nº. 10 de Matthew Street, no Cavern Club, onde actuariam por 292 vezes, até 1963 (quem hoje for a Liverpool, pode visitar o Cavern Club, não o original, mas uma réplica exacta, no mesmo local do anterior, e com a decoração da época, ao milimetro).
Foi no Cavern Club que encontraram o seu futuro agente, que estaria para sempre ligado ao início, à glória e ao fim dos Beatles: Brian Epstein que os apresentaria ao produtor musical George Martin, da EMI,  o qual se interessou pelo som da banda, e os acompanharia do princípio ao fim, Foi ele, até, que não gostando do estilo de Pete Best, sugeriu ao grupo para arranjar novo baterista, tendo a escolha recaído num tal Richard Starkey, conhecido por Ringo Starr, baterista dos Rory Storm and the Hurricanes e que, episodicamente, já tinha colaborado com a banda. Consta que a apresentação de Ringo no Cavern não terá sido a melhor, já que a assistência queria a presença de Pete Best.
E foi com esta formação que os Beatles começaram, na sequência do contrato celebrado com Epstein, as gravações nos famosos Abbey Road Studios. Refira-se como curiosidade, que a versão de “Love me do” lançada em Outubro de 1962 tinha John a tocar harmónia (instrumento que dominava, desde que o seu tio George lhe oferecera uma quando tinha 6 anos) e Ringo pandeireta, enquanto a bateria era assegurada por um músico do estúdio, Andy White. “Love me do” viria a ser classificado no 1º. lugar dos 20 melhores da revista Mersey Beat e entrou na lista dos 20 mais vendidos da Billboard.
A rota do sucesso começava e o melhor (muito melhor) ainda estava para aparecer.

 
A HISTÓRIA E O SUCESSO
O single “Please Please Me” alcança, no início de 1963, o primeiro lugar na tabela de vendas em Inglaterra e, a 4 de Novembro de 1963, os Beatles actuam na Royal Variety Performance, perante a família real. Consta que, no palco, John terá dito: “Para a última música, gostaríamos de pedir a vosssa colaboração. As pessoas nos lugares baratos, podem bater palmas. O resto pode chocalhar a quinquilharia. Gostaríamos de cantar uma canção chamada Twist and Shout”.[i]
Começa, no Reino Unido, o fenómeno que viria a ser conhecido por Beatlemania, genericamente associado a comportamentos histéricos dos fãs (mais das fãs…) e a consumo de produtos de merchandising de e com os Beatles. Mas essa explicação é apenas a ponta de um iceberg que começava a despontar. Nesse ano de 1963, o primeiro album dos Beatles, Please Please Me (que, para além das duas músicas já antes citadas, incluía, entre outras, I Saw Her Standing There, Do You Want to Know a Secret e Twist and Shout) viria a permanecer 30 semanas como o disco mais vendido em Inglaterra, vindo a ser destronado por With The Beatles, o segundo album dos rapazes de Liverpool, que incluiria, entre outras, All My Loving, Don’t Bother Me (da autoria de George Harrison), Hold me Tight, Not a Second Time, e Roll Over Beethoven (de Chuck Berry).
A crítica musical dita “séria”, começa a debruçar-se sobre a obra dos Beatles, descobrindo o casamento quase perfeito entre melodia e harmonia, e referências, até, a Gustav Mahler no final de Not a Second Time. Para um grupo que, na época, não tinha profundos conhecimentos de teoria musical, não estava mal.
1963 marca o início do sucesso dos Beatles no outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos. Marca também o início da escalada apocalíptica da guerra no Vienam. Acasos? Não existem acasos. A tradição do trovador americano que acompanha a história, as vitórias e as derrotas do seu povo, continua viva, desde a Grande Depressão e suas consequências, com vozes como Woody Guthrie, Pete Seeger, Bob Dylan, Joan Baez, Peter Paul and Mary, Paul Simon (acompanhado da voz de Art Garfunkel), Bruce Springsteen ou Eddie Vedder, sem esquecer a corrosão, acidez, sátira e empenhamento político de um Frank Zappa e os seus Mothers of Invention que, sem serem propriamente trovadores, merecem ser justamente lembrados.
Mas também há lugar para o rock local e de bandas vindas de fora dos States, como os  Beatles o provariam. Após uma intensa campanha de marketing desenvolvida por Brian Epstein (com 6 milhões de cartazes a anunciar “Vêm aí os Beatles” – a 2ª. Invasão britânica desde a Guerra da Independência), a banda aterra em Nova Iorque, a 7 de Fevereiro de 1964, perante 3.000 fâs, a maior multidão até à data concentrada num aeroporto.
No dia 9 de Fevereiro, 74 milhões de pessoas (cerca de metade da população) assistem ao vivo e em directo, ao famoso The Ed Sullivan Show onde os Beatles actuam (no dia seguinte, alguns jornais diriam que a moda é passageira…dor de cotovelo). No dia 11 fazem o seu primeiro concerto ao vivo no Washington Coliseum, e a denominada Beatlemania invade os States que, tornando-se no primeiro mercado consumidor de discos, é o alvo preferencial para divulgar a banda, o que foi conseguido, abrindo-lhes as portas do mercado americano, e também a outras bandas e intérpretes europeus, contemporâneos e futuros. Escrevia-se história. A 6 de Junho de 1964, o realizador Richard Lester estreia um filme que se tornaria de culto, sendo geralmente considerado o precursor da ideia dos videoclips: A Hardy’s Night, filmado a preto e branco, retratando a tentativa da banda em tocar num programa de televisão. Em Julho desse ano é lançado o album com o mesmo nome, que incorpora as músicas do filme, o primeiro exclusivamente com músicas de John e Paul ( ex: And I love Her, Can’t Buy me Love, When I Get Home, Tell Me Why). Em Dezembro de 1964 é lançado o seu quarto album, Beatles for Sale ( I’m a Loser, I’ll Follow the Sun, Eight Days a Week).
Os Beatles tornam-se praticamente património cultural da Grã-Bretanha (até pelas divisas que entravam no tesouro…), sendo nomeados, em Junho de 1965,  Membros da Ordem do Império  Britânico (MBE), sob nomeação pessoal do então promeiro ministro Harold Wilson (anote-se que alguns MBE conservadores, como protesto, devolveram as suas insígnias, o que não seria de espantar, hoje, Portugal, face às reacções observadas quando a Ordem de Mérito foi atribuída aos Xutos e Pontapés).
Esse mesmo ano assiste ao lançamento do filme Help!, com um sucesso inferior ao primeiro, e ao disco homónimo (Help, You’ve Got to Hide Your Love Away, Ticket to Ride, Yesterday, Dizzy Miss Lizzy). Refira-se que Yesterday permanece, até aos nossos dias, como a música mais gravada e regravada por centenas de intérpretes de  todo o mundo, desde solo a orquestras (ouçam a versão de Sinatra – disco 4 de Portrait of Sinatra-Forty Songs From The Life of a Man – Reprise Records).
A 15 de Agosto de 1965, voltam a escrever história, sendo a primeira banda a apresentar-se num estádio desportivo, o Shea Stadium, Nova Iorque, perante 55.600 pessoas, tornando-se os pioneiros de todos os futuros concertos em estádios, modificando, para sempre, tudo o que até à altura se sabia sobre padrões técnicos de iluminação e sonorização.
Por falar em pioneirismo, convém aqui recordar que as rádios “oficiais” ainda tremiam para passar música dos Beatles ou de outros grupos congéneres. Assim, e para satisfazer a cada vez maior procura, nascem as chamadas “rádio-piratas”, a mais famosa das quais foi Radio Caroline (em homenagem à filha de John Kennedy), fundada por Ronan O’Rahilly e a operar num barco fora das águas territoriais britânicas (o MV Caroline). Nos seus tempos áureos, esta emissora tinha mais ouvintes que os 3 canais da BBC juntos.
Dezembro de 1965 assiste ao lançamento de Rubber Soul, considerado o album mais inovador até então realizado, e representa, definitiva e irreversivelmente, um gigantesco salto qualitativo para a complexidade e maturidade do seu tecido musical, com letras e melodias mais elaboradas e abrindo o caminho aos albuns conceptuais, e não só (entre outras, destacamos, desse album, Norwegian Wood (This Bird Has Flown), Nowhere Man, Michelle, Girl, In My Life) .

MATURIDADE E FIM
1966 é o marco que determina o que seria a banda até ao seu fim, em 1970. O mundo já não era o mesmo, e os Beatles estavam ligados à mudança. O Papa recebe os responsáveis da Igreja Anglicana, Luther King encabeça as marchas e as reivindações dos negros pelos direitos cívicos, a guerra do Vietnam atinge o paroxismo do horror, os estudantes americanos protestam (e alguns são mortos…), o movimento hippie começa a florescer. Nesse ano, em Março, John Lennon, citado fora do contexto, dirá algo como “Somos mais populares que Jesus Cristo!”, o que levantou contra a banda uma onda de retaliações fanáticas, perturbando algumas actuações (como nas Filipinas de Ferdinando e Imelda Marcos), e originando destruição de discos e queima de partituras, recordando tempos inquisitoriais. Até o Papa Paulo VI o criticou, só tendo sido “perdoado” em 2008 por Bento XVI. E, no entanto, ela move-se…
Nesse ano, em que a 29 de Agosto, em S. Francisco realizam o último concerto ao vivo, sai, também nesse mês, o album “Revolver”, ainda mais inovador que “Rubber Soul”, com reminescências psicadélicas e orientais (Tomorrow Never Knows, Love You To), passando pela solidão (Eleanor Rigby – em Liverpool, junto à igreja de St.Peter, existe actualmente uma estátua de Eleanor Rigby, “Dedicated to all the lonely people…”  doada à cidade por Tommy Steele, como tributo aos Fab Four), e até fantasiando sobre um tema infantil, dando asas à fértil imaginação – “Yellow Submarine”. Nem por acaso, dois anos mais tarde, num inesquecível Maio de 68, alguém escreveria nas paredes parisienses: “L’imagination prend le pouvoir”.
Os Beatles estavam mais maduros, enquanto músicos e pessoas, começando a notar--se algumas clivagens entre eles, designadamente a nível da autonomia criativa.
E a imaginação criativa, iria produzir e lançar, após 129 (!) sessões de gravação, a 1 de Junho de 1967, aquele que é considerado o melhor e mais influente album da história do rock e da música , Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, e como tal considerado pela prestigiada revista Rolling Stone.   
 Motivados, por um lado, pelo lançamento, no ano anterior, do experimental e inconfundível  “Pet Sounds” dos californianos The Beach Boys, dos manos Wilson (ainda se lembram de Good Vibrations ?), influenciados por inovações introduzidas, entre outros, por Frank Zappa, Jimi Hendrix, Velvet Underground (de Andy Warhol), Pink Floyd (ainda com Syd Barrett), Janis Joplin, ou Phil Spector, os Beatles decidem ir ainda mais longe no aprofundamento da harmonia, da melodia, das letras e do experimentalismo, incluindo ao nível do equipamento técnico e de suporte musical, havendo quem ligasse a sua actividade ao consumo de drogas, que nunca negaram, mas que para esta matéria nada interessa, O circunspecto “The Times” descreve o lançamento do disco como “… um momento decisivo na história da civilação ocidental.”[ii]
Ainda antes do lançamento de Sgt., seria comercializado um compacto com duas músicas (que, mais tarde, George Martin se arrependeria de não ter incluído no album), e que se tornariam êxitos: Penny Lane, referente uma rotunda com o mesmo nome na zona comercial de Liverpool, onde Jonh e Paul, em tempos, apanhavam o autocarro para o centro, e da qual foi, também, realizado um pioneiro videoclip; e Strawberry Fields Forever, que se refere a um orfanato do Exército de Salvação (Strawberry Fields), onde John costumava brincar com as crianças aí residentes, e de cuja construção original apenas se conserva o portão vermelho, património municipal de Liverpool, e ao pé do qual, anualmente, se realizam festivais de verão. Strawberry Fields é, também, o nome do jardim no Central Park de Nova Iorque, em frente ao edifício  Dakota Apartments, onde John e Yoko viviam, e à porta do qual John foi assassinado a 8/12/1980. O jardim foi inaugurado a 9/10/1985 ( John nascera a 9/10) e contém plantas doadas por 120 países (incluindo Portugal) e um grande mosaico preto e branco, de mármore de Nápoles, onde se pode ler “IMAGINE”.
Voltando a Sgt. Pepper’s, recomenda-se, acima de tudo, uma audição atenta, de olhos e ouvidos bem abertos, para apreciar, com intensidade, desde o título inicial, com o mesmo nome do disco, a With a Little Help From My Friends, cantada por Ringo Star, a Lucy in the Sky with Diamonds (que mentes imaginativas ligaram ao LSD), ao clássico She’s Leaving Home (que muitos críticos consideraram quase música erudita- é, apenas, grande música), à “ingénua” When I’m Sixty Four, a Lovely Rita (dedicada a uma suposta fiscal de parquímetros), terminando, para além das que aqui não se citam, com a poderosa A Day In Life, por muita boa gente considerada o culminar do talento dos Beatles, uma verdadeira obra de arte em todos os sentidos, considerada a música pioneira do que se viria a designar por “rock sinfónico”. Ouçam, voltem a ouvir, porque este som viria a influenciar 45 anos de música.
Sgt. Pepper’s, durante 6 meses, ocupou o primeiro lugar do top de vendas na Grã-Bretanha, algo de impensável nos nossos dias.
Especial referência merece, também, a original capa, trabalho do artista pop Peter Blake (ganhou um dos 4 Grammys do disco – melhor capa).[iii]
Uma vez mais históricos, a 25/06/1967, os Beatles participam na primeira emissão mundial de TV, ao vivo, (Our World), interpretando, nos estúdios de Abbey Road, a canção que se tornaria num hino de uma época, All You Need Is Love, com um coro de amigos de luxo: Mick Jagger, Eric Clapton, Marianne Faithfull, Keith Moon e Graham Nash.
A 24/08/1967 os Beatles encontram-se com o lider religioso indiano Maharishi Mahesh Yogi e, sem dúvida por influência de George, partem com ele para um retiro espiritual em Bangor, País de Gales.
A 27/08/1967 morria Brian Epstein, o agente da banda desde o seu início, e o seu grande cimento aglutinador.
Em Dezembro desse ano estreiam na BBC o filme Magical Mystery Tour, tendo a banda sonora sido lançada semanas antes em LP nos Estados Unidos, e em Dezembro na Grã Bretanha, em EP duplo.
A recepção crítica aos dois produtos não foi a melhor, não obstante a inclusão de Penny Lane, Strawberry Fields Forever e All You Need is Love (que não foram consideradas no EP britânico). A canção com o nome do filme aparece como uma subliminar crítica à guerra do Vietnam.
Os primeiros meses de 1968 são passados na Índia, em Rishikesh, na companhia do seu mentor espiritual, inspirando-os para algumas canções que viriam a ser incluídas nos albuns The Beatles ( White Album) e Abbey Road. Em Janeiro desse ano, John e Paul anunciam a fundação da empresa multimédia Apple Records.
Em meados de 1968 continuava a gravação do album The Beatles, popularmente conhecido por White Album, por a sua capa ser completamente branca, e notavam-se graves dissensões entre os elementos da banda, desde a alegada excessiva presença da namorada de John, Yoko Ono, a não aceitação de canções de George, a arrogância de Paul, e a “birra” de Ringo, que não tocou em quatro das faixas do album.
A 22/11/1968, no meio de todo este ambiente, é lançado o espantoso duplo album “The Beatles” (White Album) que, posteriormente, viria a ser devidamente apreciado e consagrado, como devia ( a Rolling Stone colocou-o como o 10º. melhor album de sempre).
E não é caso para menos: While my Guitar Gently Weeps, genial música de George, Blackbird, Helter Skelter, pai e mãe do heavy metal, Revolution 1, excepcional libelo revolucionário e pacifista e, entre outras, a experimental colagem de sons que é Revolution 9,   
Ouçam-na tocada da frente para trás, e terão nos ouvidos um caos que evoca guerra, morte e destruição (daria uma excelente banda sonora para Apocalypse Now).
Razão tinha o “bom rapaz” Elvis Presley que um dia aconselhou Nixon a proibir a entrada dos Beatles nos EUA, porque, dizia ele, iam para lá ganhar dinheiro e faziam propaganda anti-americana. Ao menos, Dylan queria contruir-lhes uma estátua
Não obstante a inclusão de All You Need Is Love, All Together Now (já falaremos desta lá mais para diante), Only a Northern Song, entre outras, a banda sonora do desenho animado “Yellow Submarine”, lançada a 17/01/1969, não alcançou o êxito de anteriores produções, ao contrário do aplauso que o filme mereceu (a canção Yellow Submarine já constava do Revolver).
A 30/01/1969 os Beatles proporcionam a Londres o seu último espectáculo ao vivo, no telhado do edifício da Apple, onde interpretaram, para além do mais, Get Back. John foi o mentor do projecto, com o intuito de incluir a gravação do concerto no futuro filme Let it Be.
Com este projecto, entretanto, suspenso, os Beatles voltam pela última vez ao estúdio para a gravação do seu penúltimo album, Abbey Road, que queriam um disco simples, como nos bons tempos. A 20/08/1969 os quatro reuniram-se, pela última vez para gravar I Want You (She’s so Heavy). No mês seguinte, no mesmo dia, John anunciou, na altura apenas aos outros membros, a sua saída da banda.
Abbey Road foi lançado a 26/09/1969. Dois factos, para já: a passadeira para peões que aparece na capa do disco foi, em 2010, considerada património municipal de Londres; e Paul aparece descalço, o que alimentou, ainda mais, o boato de que teria falecido em 1966, num acidente de viação, quando não parou num semáforo vermelho, e teria sido substituído por um sósia.Os próprios FabFour, em algumas canções, gozaram com o facto (vd. Lovely Rita), embora ainda haja muito boa gente que acredita piamente na história (Elvis também está a vender cachorros quentes no Central Park)..
Não obstante os problemas existentes, Abbey Road, a par do Sgt., é, para nós, e com o White Album, o mais conseguido album do grupo, designadamente a nível da estrutura, do recurso a novas tecnologias (sintetizador Moog), e da liberdade criativa, finalmente  consagrada, de George Harrison: Here Comes The Sun e Something,
Ouçam, também, Come Together, Oh! Darling, Because, Carry That Weight. Se Sgt. É um grande disco conceptual, Abbey, segundo George, é um bom disco de Rock & Roll, e um dos mais acarinhados de sempre, para além, de ter sido de facto, a última gravação da banda.
Lançado a 8/05/1970, Let it Be, que esteve para ser baptizado de Get Back, é composto de músicas previamente gravadas, e acompanhou um filme-documentário também com título idêntico. Assinale-se que as gravações foram, entre Março e Abril desse ano, produzidas e misturadas por George Martin, e, também, Phil Spector.
 Antes do disco ser comercializado, a 10/04/1970, Paul McCartney anunciou publicamente a dissolução do grupo.
Quem o comprou e ouviu sabia que era o fim de uma era. Mas vale sempre a pena ouvir Let It Be, Two of Us, Across The Universe, Dig It, Get Back e The Long and Winding Road, que aparece quase como o resumo de uma carreira.
Assinale-se que Let it Be ganhou, em 1971 o Oscar de melhor canção original, graças ao filme-documentário atrás citado.
5 de Outubro de 1962, 8 de Maio de 1970, quase 8 anos que mudaram o mundo e durante os quais o mundo mudou. Gloriosos anos 60? Irreversivelmente, sim.

LEGADO
Assente a poeira, perguntamo-nos se, passados estes 50 anos, resta alguma coisa das memórias dos Beatles, tendo em atenção, segundo alguns, a vida efémera da música dita ligeira.
Atente-se nas palavras do nosso querido Vitorino de Almeida, numa entrevista publicada na sequência da sua participação num anúncio televisivo de uma conhecida rede de multimédia, em que a música de fundo é o All Together Now dos Beatles: “Ora bem, eu acho que estar a tocar muitas coisas dos Beatles e outros do género – e, ainda por cima, a juventude também já não quer saber nada dos Beatles- não é o caminho. A música ligeira é efémera, tem um sucesso de borboleta (risos). Vive meses… às vezes vive semanas e desaparece”[iv]
Em relação à “borboleta” Beatles, a sua cidade natal soube reconhecer a importância da banda para o renascimento de Liverpool, após os anos de chumbo thatcherianos com o encerramento dos estaleiros, estando dotada de um museu multidisciplinar dedicado aos Fab Four[v] (The Beatles Story) e, para além dos locais que fomos assinalando ao longo do texto, a 9/10/2010, no 70º. Aniversário de John Lennon, a cidade inaugurou, no Chavasse Park um monumento dedicado ao cantor e músico: o Peace and Harmony – European Peace Monument, de Lauren Volvers.
A nível nacional, o estudo das letras, músicas e influência dos Beatles na sociedade é obrigatório no U.K. National Curriculum, isto é, no sistema de ensino britânico, anos 3 a 6 (crianças entre os 7 e os 10 anos). Há quem defenda e valorize os seus agentes culturais.
Para além de tudo o que se deixou relatado sobre a extrema influência dos Beatles na música dita ligeira, desde os videoclips, novas tecnologias, rock “sinfónico”, heavy metal, concertos em estádios, atente-se na atenção que lhes foi dedicada por muitos agentes da chamada música “erudita”. Um dos grandes maestros e compositores do século passado, Leonard Bernstein, mentor, responsável e divulgador dos famosos Concertos para Jovens (de 1958 a 1972), nos quais, de forma simples e pedagógica divulgou os comos, porquês e para quês da música “erudita”, não hesitou, em pelo menos duas ocasiões, de se servir, como exemplo, dos Beatles: na sessão 28, a 6/11/1964, dedicada à Sonata, apela a uma música típica da banda, And I Love Her, para a sua aula; o mesmo acontece com a sessão 36, a 23/11/1966, sobre o Modo, em que se socorre da “…absolutamente encantadora música dos Beatles, chamada Norwegian Wood”.[vi]
Aqui para nós, imaginem um pianista (poderia ser o nosso querido e saudoso Bernardo Sassetti, que não tinha borboletas na cabeça), sentado a tocar três pequenas peças para piano. Qual a melhor, qual a grande diferença, entre a leveza e alegria de “Eine kleine Nachtmusik”, de Mozart, o lirismo de “Fur Elise”, de Beethoven, ou a melancolia de “Yesterday”, de McCartney ?         
Mas ultrapassemos a música. Os anos 60 testemunham uma das maiores revoluções do século XX, e não falamos apenas de transformações políticas, que as houve, até mais como consciencialização das pessoas e de minorias (protestos contra a guerra do Vietnam, assassinatos de John Kennedy, Bob Kennedy e Luther King), a afirmação dos direitos da comunidade negra dos EUA, que se assume como um EU/NÓS activo, cidadãos de pleno direito. Assiste-se, conjugada com o protesto contra a guerra (a única guerra transmitida em directo pelas TV’s, o que não mais sucederia, “compreensivelmente”…), à consagração de criadores como Jack Kerouac ou Allen Ginsberg, ao despontar e alastrar do movimento hippie, e estamos, muito resumidamente, a falar dos EUA.
Tanto ou mas importantes que a evolução política, é o verdadeiro salto nas relações escola/professor/estudante (a simples autoridade do mestre não chega, temde mostrar que a autoridade também sabe e aceita críticas, acabaram-se a sebenta e o magister dixit, a experimentação, a investigação, o diálogo tomam os seus lugares ), pais/filhos, (os pais não sabem tudo, passam a companheiros, amigos, escutam o que os outros têm para dizer, os filhos também sabem o que é o melhor para eles) homem/mulher (macho/fêmea são apenas ele/ela, dois indivíduos, um projecto comum). Uma nova moral, mais aberta e franca, vem substituir dogmas inculcados há séculos que uma dita sociedade de abundância pós-guerra visava perpetuar. Os antigos dogmas são postos em causa, por vezes de maneira brutal. Quando o cientista Alfred Kinsey publica o famoso “Relatório Kinsey ” dividido em dois livros “Sexual Behavior in the Human Male” (1948) e “Sexual Behavior in the Human Female” (1953)[vii], a América profunda reage com horror e falso pudor. Os mecanismos do prazer e da repressão sexuais sâo traduzidos de forma clara e documentada. E é o desenvolvimento desta revolução sexual que também marca os 60’s. A mulher-objecto é destruída, os direitos e deveres na relação a dois, e para com os filhos, passa a ser igual, a responsabilidade, a dor e o prazer também. É a década da pílula, ainda embrionária e das primeiras e legais interrupções voluntárias de gravidez. Os filhos são desejados, não suportados.
Quando em Londres Mary Quant lança a mini-saia, não é só de moda que falamos, aliás, nem sequer de moda, é uma forma de libertação e afirmação femininas (ouçam, de novo, She’sLeaving Home). Carnaby Street, em Soho, Londres, torna-se o centro das novas tendências e projectos (Carnaby Street, actualmente, está mais “domesticada”. Reparem, no entanto, no nostálgico mural do prédio da Broadwick Street que faz esquina com Carnaby: para além de muitos rostos conhecidos . tipo capa do Sgt. Pepper’s, destacam-se os dois mais famosos marxistas da história- Karl Marx e Groucho Marx).
Os ventos de mudança atingem, na Europa, particularmente a França. Durante um inesquecível mês de Maio de 1968, que pensamos analisar brevemente, o que começa como simples reivindicação estudantil transforma-se em contestação política, social, laboral e cultural, onde estudantes e trabalhadores ultrapassam o próprio enquadramento político e sindical e tomam a rua. O poder, porém, depois de abalado, retoma as rédeas, mas a França, tal como a Inglaterra, os Estados Unidos e outros, não seria a mesma.
Mais que mudanças a nível da superestrutura mudaram-se, radical e definitivamente, padrôes civilizacionais, comportamentais e culturais, Uma juventude mais experiente, mais solidária, mais igualitária, mais exigente, mais culta, mais sensível, emergia. Como diziam os que eram realmente mestres, nos corredores da Sorbonne e Nanterre (poderia ser em Harvard e Oxford) : “És mais novo do que eu, logo és capaz de ter razão!”.
Os anos 60, queiram ou não queiram, mudaram o mundo e a nossa maneira de o ver e entender, e o mundo mudou vertiginosamente.
Transversais a estes ventos de mudança estiveram sempre a música e a influência dos Beatles, fosse em concertos, manifestações, sit-ins, transistor colado ao ouvido, trauteando as melodias na rua.
A sua contribuição não se resumiu a meses ou semanas, estendeu-se por estes últimos 50 anos, e vai continuar a estender-se (entrem no YouTube, escolham, por exemplo, Yesterday, e leiam os comentários, favoráveis ou desfavoráveis, e a idade de muitos dos comentadores), tal como sucede como toda a grande música, de Monteverdi a Bach, de Mozart a Beethoven, de Wagner a Benjamin Britten, de Gershwin a Lennon/McCartney. Podemos gostar, ou não gostar. Mas não ficamos indiferentes.
Assim, deixem a borboleta voar sobre campos repletos de flores coloridas, céus azuis e mares verdes, eternamente sulcados pelo Yellow Submarine.
E é tão simples, afinal all you need is love.          
   
 
 Luís Diogo-19/07/2012 "
   


[i] - www.beatlesbible.com/1963/11/04/live-royal-command-performance/
[ii] - BBC 15 Factos a respeito de Sgt. Pepper’s. (http://www.sunrisemusics.com/factos.htm), Sunrise Musics
[iii] - Os outros Grammys foram : Melhor album do ano, Melhor album contemporâneo e Melhor engenharia de som.
[v] -Temos referido diversas vezes esta palavra: FabFour = Fabulous Four (os 4 Beatles)
[vi] -www.leonardbernstein.com/ypc.htm

[vii] -Ambos publicados em Filadélfia por Walter Burns Saunders

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