Querida Sophia, hoje vão emparedar-te no Panteão.
Vais ficar entre Aquilino Ribeiro e Humberto Delgado, decerto boas companhias, mas tu, Sophia, gostarias era de respirar o poema, e de ver o mar, o mar que tu adoras, o mar que te inspira, e que mal se avista, ou até não, ali da colina de Santa Engrácia.
Mar Sonoro
Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que suponho
Seres um milagre criado só para mim.
Mas sabes, Sophia, ali confinada talvez te julguem silenciada, veneranda, objecto de peregrinação,
esquecida, desconhecendo a rebelde que foste, o grito na escuridão, a poesia acesa, certeira.
Aqueles que te desconhecem, talvez pensem que ser artista não é inovar, criar, abrir o mundo, abrir
a inteligência, obrigar a pensar e a agir, mas sim venerar o poder e agradecer a paga que lhes dão,
quando dão, como fizeram ao grande Camões, que cantaste.
Camões e a Tença
Irás ao paço. Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada.
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce.
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou ser mais que a outra gente.
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto.
Irás ao paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência.
Este país te mata lentamente.
Seja paga na data combinada.
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce.
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou ser mais que a outra gente.
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto.
Irás ao paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência.
Este país te mata lentamente.
Desconhecem, talvez, digamos, de certeza, que cantaste as dores desta Pátria mas, também,
a sua redenção, a catarse colectiva em que acordámos em Portugal.
Pátria
Por um país de pedra e vento duro
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro
Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Dum longo relatório irrecusável
E pelos rostos iguais ao sol e ao vento
E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas
- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro
Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo
Por um país de luz perfeita e clara
Pelo negro da terra e pelo branco do muro
Pelos rostos de silêncio e de paciência
Que a miséria longamente desenhou
Rente aos ossos com toda a exactidão
Dum longo relatório irrecusável
E pelos rostos iguais ao sol e ao vento
E pela limpidez das tão amadas
Palavras sempre ditas com paixão
Pela cor e pelo peso das palavras
Pelo concreto silêncio limpo das palavras
Donde se erguem as coisas nomeadas
Pela nudez das palavras deslumbradas
- Pedra rio vento casa
Pranto dia canto alento
Espaço raiz e água
Ó minha pátria e meu centro
Me dói a lua me soluça o mar
E o exílio se inscreve em pleno tempo
25 de Abril
Esta é a madrugada que eu esperava
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
O teu Panteão, Sophia, é o País, o Mar, a Areia, a Lua, a Manhã.
É a poesia!
E se te querem homenagear, divulguem os teus poemas, nas escolas, em todas elas, em
todas as colectividades, não a escondam, leiam-nos, estudem-nos, amem-nos.
Mas, querida Sophia, é tarefa demasiada para quem não vê, não ouve e não lê.
Deixa lá...
A Poesia abraça-te e acolhe-te, cantando os teus versos, enrolados na espuma que, porque não, beija a areia nas praias gregas, que adoravas.
Mas nós vemos, ouvimos e lemos.
Até sempre, Sophia.
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